Então galera, eu havia preparado uma postagem grande pra explicar os motivos de nossa ausência, isso há uns três dias. Falei, dentre outras coisas, em um grande vilão chamado Vida Real ser o responsável pelo afastamento do grupo, além de chamar a responsabilidade do blog para mim enquanto os outros permanecem desaparecidos/enrolados... Porém, numa crise recente de desânimo, não me acredito capaz de manter a promessa de postar com frequência, por isso resumo tudo que tinha para falar neste parágrafo e aproveito para colocar aqui um texto que já tinha pronto nos rascunhos, devidamente trabalhado e revisado. Aqui vocês saberão um pouco do início da Era do Vapor e de uma das inúmeras armas da Federação dos Seis em sua busca pela supremacia. O próximo texto tratará de uma descrição detalhada dos Translocantes, tentando uma abordagem próxima da que se vê nas classes de RPG.
Mais uma vez, muito obrigado por todo seu apoio até aqui. O Steamage não tentaria prosseguir sem vocês.
Heitor V. Serpa
Heitor V. Serpa
O início da Era do Vapor e as origens dos translocantes
Pelo Duque de Brandes
Quando a cidade voadora surgiu sobre as montanhas de Kresta e o homem teve seu primeiro contato com a raça pequena e repleta de engenhocas que a habitava, iniciou-se a Era do Vapor. A história é deveras longa e enfastiante para ser narrada na íntegra, portanto irei resumi-la para trazer o entendimento do que é realmente importante.
Os pequenos – a partir de agora os chamarei de anões – aterrissaram num mundo arcaico, marcado por conflitos que anexavam e dividiam reinos no piscar de uma geração. Naquela época, as minas krestinianas eram repartidas por duas potências: os reinados de Lucrea e Acresya. Diplomatas, forças de exploração e defesa foram enviadas de ambas as partes; tensos foram os primeiros encontros, afinal tratava-se da invasão de um território disputadíssimo pelos seus recursos. Os anões reconheceram a violação e disseram necessitar das jazidas para abastecer sua morada. O capitão Kell W. Morgan os descreveu melhor em sua carta para o rei de Acresya, contando o fato deles virem de um lugar muito distante e falarem de sua cidade como “A Salvadora”, ou “A maior das invenções”. Ele foi impreciso no instante de traduzir o significado da expressão.
No fim chegou-se a um acordo: os anões teriam posse de parte das montanhas, partindo tão logo suas fornalhas fossem abastecidas. Em troca, estes saciariam o homem com aquilo que define cada passo na direção de suas ambições, a chave que separa o poder.
O homem quis o conhecimento.
A evolução, primeiro nesses dois reinos, se expandiu pelo mundo de maneira absurda, como uma língua de chamas devoraria uma floresta, e assim os reinos convergiram em seis países juntos numa Federação com sua primeira sede nos terrenos de Kresta. Houve paz, até o momento em que os anões desejaram uma fatia maior das minas e avançaram até tomar as montanhas para si. Os detalhes desse período, bem como suas conseqüências, se encontram no tomo “O seqüestro do rei anão e a Guerra Fria de Kresta”. Aqui, o que importa de verdade é deixar clara essa discordância como um dos motivos para o ser humano iniciar uma série de marchas e navegações em busca de recursos, aumentando ainda mais sua sede de riquezas – e a curiosidade científica, por tabela – enquanto buscava um novo pólo comercial. O papel dos inventores ganhou força definitiva nesta fase da história, vinda do ano de 1315 até os dias de hoje. Há um pouco de discordância sobre a nomenclatura correta: uns chamam de “Era da Supremacia” ou “Era das Navegações”, outros de “Era das Invenções”, e alguns querem dar crédito ao termo “Era dos Humanos”. Eu particularmente sou adepto do segundo.
Foi com essa ganância que a Federação voltou suas atenções para lugares inóspitos, antes mencionados nos mapas como extremos do mundo, alvos de aventureiros sem muito amor pelas próprias vidas. Entre eles o Deserto da Origem, onde algumas correntes religiosas como a Khalari dos Errantes e a Una Federativa acreditam estar a fonte de toda a vida. Curiosamente, nunca foram achados indícios de qualquer população no local, excetuando-se a de algumas monstruosidades capazes de dilacerar um corpo em segundos ou tragar expedições inteiras para debaixo das dunas.
Desnecessário dizer o quanto os federados ansiavam descobrir essa origem; certos generais acreditavam inclusive que se tornariam imortais ao deter tal conhecimento. Contudo, esta proposta sequer fora mencionada como pretexto para a travessia dos desertos, pois geólogos haviam descoberto a possibilidade de haver por ali fontes de óleo e gás natural – sendo o último um recurso mais barato que a produção do vapor. Com base no caminho usado por peregrinos e nas rotas mapeadas pelos poucos exploradores de sucesso, traçou-se uma direção até um limite considerado seguro, montando-se um posto avançado batizado de ALTA por se encontrar sobre uma meseta. O perigo era iminente, muitas caravanas não conseguiam sair ou chegar à base, mas a cruzada se desenvolvia de maneira satisfatória. A primeira fonte de gás foi encontrada, o que deu início a montagem de ALTA 2.
Então os fantasmas apareceram. Tidos como um mito que assombrava os viajantes, nunca antes considerados como população, eles mostraram competência e organização estratégica ao espalhar o caos pela base, um ataque depois do outro, sem dar tempo para descanso. Não se sabe até hoje o que chamou a atenção desses seres, mas algo com a exploração das jazidas não lhes agradou. Talvez estivessem espreitando a muito tempo, precisando apenas de uma oportunidade para agir, ou poderiam ser pacíficos, incitados a guerra por algum tipo de dano à sua morada. Incontáveis entrevistas com os sobreviventes foram gravadas, e ainda assim não se chegou num consenso. Importa a mim, mais do que falar das sabotagens, descrevê-los da maneira que os vi e contar aquilo que li.
Eles se intitulavam os Sajjad Naog, algo de tradução um tanto complicada, pois em meus estudos posteriores Sajjad pareceu remeter a algum tipo de prostração religiosa, meditação ou estado de transe, enquanto tive a impressão de Naog ser usado como o verbo “caminhar”. Acompanhando seus movimentos pelos alicerces de ALTA 2, descobri algo que mais tarde foi de importância ímpar para o contra-ataque da Federação: eles não eram de fato etéreos, mas conseguiam de alguma forma tornar seus corpos intangíveis como se feitos de nuvens de areia. Quando apanhados de surpresa, se feriam e podiam inclusive morrer... Ou ao menos parecia isso de início.
Antes de prosseguir, devo falar de um amigo de longa data, portador de uma curiosidade (junto de uma pitada de sorte) que levou seu nome a ser registrado como um dos maiores inventores da história. Genial, corajoso, por vezes um tanto tolo e arrogante, afinal seus pais vieram de Alphina, país conhecido pela intolerância a outras raças. Ainda assim, um grande homem. Seu nome era Enzo Trovale, e ele também fazia parte da expedição. Quando os Sajjad Naog apareceram pela primeira vez, não pensei em mais nada que não fosse alertá-lo. Praticamente tudo que está sendo dito aqui foi observado em conjunto, em especial as partes que nos levaram para fora da base, já que eu nunca teria abandonado meu refúgio se não fosse a insistência um tanto enfadonha deste rapaz. Sua falta de medo por vezes o tornava infantil, motivo para uma série de discussões que hoje em dia soam muito engraçadas.
Voltando aos fantasmas: eles pareciam morrer quando feridos de maneira grave pelos atiradores de elite federados, mas voltavam a nos assombrar em menos de duas semanas. Como não atacavam em grupos com mais de dez unidades e pareciam estar espalhados por toda a Origem, foi difícil chegar a esta conclusão até o instante em que passamos a reparar em suas características físicas. Os Sajjad Naog seguiam um padrão que seria visto mais tarde nas Terras Livres, e depois na região de Insecura: orelhas longas e pontudas como facas, pele num tom pastel que se misturava com a areia e cabelos na mesma coloração, em geral curtos e quebradiços. Altos, marcados por desenhos tribais nas partes visíveis de seus corpos sempre envoltos em muitos panos. Às vezes tenho a impressão de que este mundo pertence a eles e não ao homem... Mas enfim, Enzo em sua curiosidade começou a reparar nos detalhes que diferenciavam um indivíduo do outro, chegando à conclusão de que alguns reincidiam nos combates mesmo depois de mortos a quase uma semana de distância. Como os fantasmas se dissolviam em areia quando abatidos, sem deixar cadáveres, começamos a analisar a possibilidade de serem imortais.
A base de ALTA 2 nunca ficaria pronta no andar das coisas. A Federação, por mais que lutasse, estava de mãos atadas contra o desconhecido. Quando enviamos o relatório de nossas análises mais recentes para o comandante, a idéia de cancelar a exploração começou a ganhar força. Não poderiam vencer em território desconhecido, uma hora as baixas seriam impossíveis de se superar. Como barrar a ira daqueles que atravessam muralhas e ainda assim carregam o fio da morte, derrubando grupamentos inteiros com sua dança de espadas? Como parar aquilo que não morre?
De certo havia um segredo para esse poder, em algum lugar onde se reuniam de tempos em tempos, tido como sagrado ou algo do tipo. Intuição ou não, nós sabíamos disso. Foi com este ideal que começamos a rastrear as direções que eles usavam para chegar no posto de extração. Como esperado, havia um padrão quase imperceptível na maneira que se aproximavam, como se saídos das fissuras um formigueiro gigantesco debaixo de nossos pés. Eu ainda estou tentando descobrir como fomos capazes de espioná-los em completa desvantagem, ainda por cima nos infiltrando em seus covis sem sermos vistos... Começou quando encontramos uma espécie de portal de barro seco escondido nas dunas, mais ou menos parecido com a entrada de um poço. As inscrições rúnicas presentes ali me interessaram, mas não disseram nada além do fato de estarmos diante de uma cultura inteligente e letrada, completamente diferente da nossa. Com exceção de alguns vigias etéreos, o local parecia vazio, abandonado. Eu prefiro acreditar que, pela impressão vasta que tive ao percorrer infinitas galerias e corredores, não chegamos a explorar um terço do local na primeira vez.
A sensação se confirmou nas próximas visitas. Tornava-se cada vez mais difícil passar despercebido, mas conseguíamos. Como não acreditar que a bênção dos deuses caía sobre nós dois naqueles momentos? Embora Enzo discorde veemente de mim, devo dar o crédito desta exploração para Eles. Vimos mais inscrições nas paredes, relatos de certas passagens da história dos Sajjad Naog. Duas evidências apontavam para esse sentido: uma eram as frases acompanhadas de figuras, e a outra era a repetição de tais imagens por toda parte. As que mais me intrigaram foram a de um leão gigantesco sentado na areia, usando uma espécie de turbante e parecendo ser feito de pedra, junto de uma espécie de câmara em forma de casulo e cercada por raios de energia, contendo grupos em oração. Por fim, na última incursão, chegamos a uma parte que me deixou deslumbrado.
Eles tinham uma biblioteca!!! Eu como lingüista me fartei neste ambiente, tomando o máximo cuidado para não destruir os materiais em que os Sajjad escreviam; lembravam papiros muito bem conservados, e que pelo visto eram consultados regularmente. Desta vez eu quase botei o trabalho de dias a perder, pois havia um guardião responsável pela câmara do conhecimento... Foi nosso único combate nos dias de exploração, e mesmo assim quase não conseguimos sair com vida. Roubei diversos exemplares durante a fuga, e num futuro não tão distante eu voltei até lá em busca de mais.
O que obtivemos já bastava para suprir a Federação com todos os dados necessários para uma invasão. Enzo havia guardado na mémoria cada corredor do covil, e uma parte dos tomos continha o esboço de mapas. Era ali que estava o segredo de sua imortalidade, pois um dos desenhos levava a mesma câmara com raios de luz desenhada pelas galerias. Sua dimensão era gigantesca, tendo como título uma runa parecida com a usada por eles para se identificar. Quando descobri o que era Sajjad Naog ficou mais fácil de obter o nome da grande sala: Miraj Naog, sendo o primeiro termo usado como “local de ascensão”. Só faltaram as setas para identificar o local como o coração da existência fantasma, e após um conselho estratégico do qual nós dois participamos as coisas terminaram da maneira de sempre, com uma mega operação de guerra para expulsar todos que eram contra a Supremacia Humana. Incrível, nem seres etéreos foram capazes de parar a máquina do progresso... Sinceramente, eu temo pelo futuro deste mundo.
Estive enclausurado em meu quarto durante o contra-ataque, entretido demais com o estudo dos tomos, de modo que só posso contar por alto o que aconteceu. Enzo dividiu a liderança das linhas de combate com o comandante, guiando as tropas pelo refúgio dos Sajjad que, mesmo preparados para a batalha, pouco foram capazes de fazer para detê-los. Meu amigo contou que a estratégia adotada foi avançar para o Miraj Naog sem se importar com as baixas sofridas pelo caminho, correndo de um jeito que obrigou o inimigo a tomar formas físicas para impedir a passagem e, por conseqüência, se tornar vulnerável. Enquanto isso, os dispositivos portáteis de cerco lidaram com as armadilhas previstas nos mapas. Quanto ao coração, eu tive a oportunidade de visitá-lo mais tarde: de perto era ainda mais majestoso, com entalhes de pedras preciosas e ouro. Diversos casulos se enfileiravam em pelo menos vinte níveis, orbitando algo que só posso definir como um mini-planeta com um coração pulsante. Esses compartimentos guardavam um corpo mutilado cada, apenas tronco e cabeça em estado de transe, deixados assim em um sacrifício ritual chamado Liak Na’im. Quando realmente mortos, um fantasma desaparecia para sempre.
Já deve ser evidente o que aconteceu. Mesmo assim, me sinto na obrigação de apontar as evidências; primeiro, sendo a base adversária subterrânea, a Federação tinha os meios para implodi-los sem perder um décimo dos homens necessários para uma invasão frontal. Segundo, o fato de meus estudos avançarem mostrava que a aparente superioridade dos fantasmas poderia ser desvendada. Eu na verdade desejava apenas saber mais sobre esta raça, em momento algum desejei seu extermínio, muito menos que os segredos de sua cultura fossem convertidos a propósitos militares. Mais uma vez, meu desejo de conhecer mais de todos os mundos acabou em uma coisa ruim.
Fora tudo que descobri explorando as ruínas de mais uma civilização exterminada, o que fez realmente a diferença foi aquele núcleo, onde corpos incapacitados porém vivos se conectavam para gerar uma imagem etérea, projeção mental ou espiritual de organismos inertes. A teoria que explica como esta ligação é possível é a do Conexo Mental.
Deixei a tarefa de decifrá-lo para Enzo Trovale, mesmo porque ele quem mais se interessou por aquela tecnologia. Uma vez ele me contou algo sobre o pai dele ser um veterano de guerra que sofria muito pelo fato de ter sido incapacitado quando jovem... Por isso não sinto remorso deste rapaz; ele pensou numa coisa linda, e teria destrinchado o segredo dos Sajjad Naog com a melhor das intenções. Infelizmente, o peso de suas ações caiu cedo demais, e ele deu cabo da própria vida antes de iniciar qualquer análise eficiente. De novo, o homem mostrou sua capacidade de se devorar na própria ganância, tragando até mesmo os anjos para o mal.
Hoje em dia a Federação conta com um grupo de agentes de elite chamados Translocantes, capazes de se deslocar por uma dimensão de vapor ao seu bel prazer. Seus corpos reais se encontram presos a uma matriz no Átrio do Conselho – atual centro nervoso dos seis países – enquanto aquilo que age nas missões de alto risco nada mais é do que um avatar, um fantasma praticamente igual ao do povo dos desertos. A antiga morada dos Sajjad Naog se transformou numa área de treinamento para esses agentes, sendo também um centro arqueológico que qualquer um afim de se meter a explorador deve visitar. Seu nome atual é ALTA 3.
O Deserto da Origem também é usado como palco de testes para os mais novos armamentos federativos antes de serem lançados sobre mais vidas inocentes.
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